domingo, 31 de março de 2024

François Truffaut - “A História de Adele H.” / “L’Histoire D’Adele H.”


François Truffaut
“A História de Adele H.” / “L’Histoire D’Adele H.”
(França - 1975) – (96 min. / Cor)
Isabelle Adjani, Bruce Robinson, Sylvia Marriott, Joseph Blatchley.

Ele ficava parado, completamente fascinado, a olhar os cartazes de cinema e aquelas fotografias, que se estendiam pelo hall de entrada e num impulso, tantas vezes repetido ao longo da infância, retirava a fotografia e fugia com os seus actores favoritos, corria pelas ruas, porque muitas vezes era seguido por alguém que gritava – "agarrem o miúdo!"... e assim continuou ao longo dos dias, das semanas e dos meses. Um dia resolveu roubar uma máquina de escrever, para criar o seu primeiro argumento, acabou no reformatório... o seu nome é François Truffaut.


Muito mais tarde começou a ir à Cinemateca, criada por Henri Langlois, mas as moedas eram muito poucas para poder ver todas as sessões de cinema e um dia o Bom Henri reparou nele e "adoptou-o". Ele foi um dos filhos da Cinemateca e aquele impulso para a escrita acabou por conduzi-lo a André Bazin, uma espécie de irmão mais velho, que todos respeitaram ao longo de uma vida, mesmo quando não concordavam com as suas "leituras cinematográficas". Assim nasceu um dos mais apaixonantes críticos de cinema dos "Cahiers du Cinema" e um dos fundadores da chamada "Nouvelle Vague".


Naqueles anos o cinema Quarteto era a minha catedral do cinema. Passava lá as tardes e depois as noites de fim-de-semana, por causa dos ciclos, mas naquele dia à tardinha, ao entrar, fiquei profundamente deslumbrado pela imagem de Isabelle Adjani. Sim, ia ver o filme do François Truffaut e nada sabia da película ou da história da filha de Victor Hugo e o "H" nada me dizia, até que as luzes se apagaram, os "trailers" terminaram e o filme começou. Eu que ainda hoje sou um romântico e adoro o melodrama no cinema, ali fiquei colado à cadeira a conhecer a louca paixão de Adéle Hugo pelo Tenente Pinssen.


Adéle abandona os pais que vivem no exílio e segue para Halifax, ali tudo faz para recuperar o seu amor, nunca olhando a meios para o reconquistar, no entanto esse desejo não será concretizado e apesar de todos os cenários mágicos criados na sua mente, o seu destino será trágico, terminando a andar como uma mendiga nas ruas de Barbados, em busca do sonho inalcançável, até que alguém repara nela, a recolhe e a alimenta, conseguindo o seu regresso a casa do Grande Escritor. Ali terminou os seus dias, sempre a escrever e François Truffaut oferece-nos desta forma, numa realização em que o habitual plano sequência se impõe, uma das suas melhores películas de sempre.


Isabelle Adjani, nesse ano de 1975, foi nomeada para o Oscar de melhor actriz. Hoje é uma das Grandes Senhoras do Cinema Francês. Mais tarde, em "Camille Claudel", interpretou outra personagem consumida pela paixão. Neste caso o cavalheiro era Auguste Rodin, mas François Truffaut já não estava por detrás da câmara (nem iria fazer uma pequena aparição, citando o seu mestre bem amado Alfred Hitchcock, como sucedia em "Adéle H.") e o filme, revelou-nos, caso fosse preciso, a força da arte desta actriz, que mais uma vez nos oferece uma soberba interpretação, embora não atinga esse amor louco que habitava a sua inesquecível interpretação em "Adéle H.".


Redescobrir esta película é entrar no interior do universo romântico, amando os pequenos gestos do desejo, numa paixão assombrosa pelo cinema e isso só é possível graças a esse nome incontornável chamado François Truffaut.

Rui Luís Lima

Wim Wenders - “Movimento em Falso” / “Falsche Bewegung”


Wim Wenders
“Movimento em Falso” / “Falsche Bewegung”
(Alemanha - 1975) – (103 min. / Cor)
Rudiger Vogler, Hanna Shygulla, Nastassja Kinski, Lisa Kreuzer, Ivan Derny.

Wim Wenders, o mais fascinante cineasta alemão depois de Rainer Werner Fassbinder, decidiu trocar a Alemanha pela América, a sua nova Pátria, para mais tarde se tornar uma espécie de cidadão do Planeta. O filme de que desejamos falar hoje é um road movie, com estradas, mas sem carros intitulado "Movimento em Falso".


"Movimento em Falso" / “Falsche Bewegung” e uma película datada de 1975, que constitui segundo muitos um dos andamentos da sua trilogia alemã "on the road", composta por "Ao Correr do Tempo" / "Im Lauf der Zeit", "Alice nas Cidades" / "Alice in den Stadten" e a obra em questão. Se a viagem através da Alemanha em busca de uma identidade individual e colectiva, perdida nas cinzas da memória da História recente, é o elo de ligação entre os três filmes, já o tema da viagem é um elemento constante de todos as suas películas do período alemão, a par da memória do cinema norte-americano, bastando recordar "Paris/Texas" e "Hammett", para já não falarmos em "Nick's Movie" um outro género de memória, como todos sabemos.


"Falsche Bewegung" / "Movimento em Falso" é a viagem de Wilhelm (Rudiger Vogler) através da Alemanha (debaixo da sombra de Goethe) em busca da sua própria vocação adormecida: ser escritor. Decidindo conviver com todos aqueles que vai encontrando ao longo do seu trajecto. Os seus companheiros de estrada são uma actriz (Hanna Schygulla) – a presença dela é cristalina – um velho, antigo membro das SS, (representante do passado e da sua história recente), uma adolescente (Nastassja Kinski) e um poeta meio-louco mas civilizado.


Mais uma vez Wim Wenders nos oferece o seu retrato da Alemanha através de personagens marginais, embora contendo no seu interior o exemplo perfeito da composição social. Recorde-se que este filme foi ainda realizado nessa década que ficou conhecida como os "anos de chumbo" e que de certa forma foram retratados nesse filme colectivo intitulada "A Alemanha no Outono" / "Deutschland im Herbst", no qual Wim Wenders curiosamente não participou.


Olhar esta película de Wim Wenders é encontrar a solidão: a maior inimiga do ser humano. E é essa mesma solidão que nos acaba por invadir durante o visionamento de "Movimento em Falso", obrigando-nos a procurar após o seu final outros rostos humanos, em busca de palavras/diálogos para a construção de um novo romance.

Rui Luís Lima

Michelangelo Antonioni - "Profissão Reporter" / "Professione Reporter"


Michelangelo Antonioni
"Profissão Reporter" / "Professione Reporter"
(Itália/França/Espanha/EUA-1975) - (126 min. / Cor)
Jack Nicholson, Maria Schneider, Jenny Runacre, Ian Hendry.

Michelangelo Antonioni é um dos nomes incontornáveis da História do Cinema. Oriundo da burguesia, iniciou-se no documentário com “Gente del Pó” (1947) e nunca sentiu perto de si o célebre apelo do neo-realismo, tão em voga no após-guerra, e em toda a sua obra apenas “O Grito” / “Il Grido” se filia nessa tendência. A pouco e pouco o cineasta foi criando o seu próprio espaço, no qual a comunicabilidade irá ter um papel preponderante, estamos assim longe de um homem que elege a palavra como forma de arte, nada disso, já que será o estudo do(s) silêncio(s) um dos principais motores da sua obra, recorde-se o célebre final de “Blow-Up” e a partida de ténis imaginada pelos seus participantes e espectadores, que convidam o protagonista a participar no “jogo” quando lhe pedem para devolver a bola ao corte de ténis.


Tal como Josef Von Sternberg elegeu Marlene Dietrich como a sua musa, também Michelangelo Antonioni encontrou em Monica Vitti e na sua voz rouca e sensual a imagem perfeita da mulher que desejava para a sua obra cinematográfica, culminando a sua participação nessa obra-prima intitulada “O Mistério de Oberwald” / “Il Mistero di Oberwald”. Nunca é demais recordar que será através da película “A Aventura” / “L’Aventura” que o cinema de Antonioni irá passar as fronteiras do seu país em 1960, alcançando um sucesso enorme a nível internacional, seguindo-se nos dois anos seguintes “A Noite” / “La Notte” e “O Eclipse” / “L’Eclipsse” constituindo assim a célebre trilogia do silêncio, aliás, repare-se no destino final de Marcello Mastroianni e de Alain Delon em ambos os filmes, rodeados de solidão. Essa mesma solidão que esmaga Monica Vitti em “Deserto Vermelho” / “Il Deserto Rosso” , o primeiro filme a cores do cineasta, que irá trabalhar a cor até ao mais pequeno pormenor, num desejo extremo de atingir a perfeição absoluta.


Depois Michelangelo Antonioni parte para Inglaterra e em plena capital londrina conquista o seu maior êxito comercial, através da história de um fotógrafo, “Blow-Up” mostra-nos como é limitado o nosso olhar, no interior do mundo que nos rodeia. Com este sucesso internacional, foi com naturalidade que nasceu o convite para rodar duas películas nos Estados Unidos. A “contracultura” fascinava o cineasta e os tempos estavam propícios a isso, com as revoltas estudantis e o movimento hippie em alta, nasce assim “Zabriskie Point” / “Deserto de Almas” e o cineasta decide assumir-se como autor até às últimas consequências. Primeiro rejeitou as estrelas propostas pelos executivos dos Estúdios, optando por dois actores estreantes no cinema e depois inflacionou estrondosamente o orçamento, ao insistir em fazer explodir o avião no Aeroporto, o que obrigou a que o tráfego na zona de Los Angeles fosse interrompido. “Zabriskie Point” / “Deserto de Almas”, comercialmente foi um falhanço, mas permanece como um documento perfeito de uma época em que a revolta estava na ordem do dia. Como curiosidade não nos esqueçamos das polémicas sequências no Vale da Morte e da colaboração dada na feitura do argumento do filme por Sam Shepard.


Como os contratos são para cumprir, o segundo filme de Antonioni em solo americano seria “Profissão Repórter”, que irá ter o título americano de “The Passenger” e desta vez o cineasta convocou para o seu filme Jack Nicholson que na época como sabemos era um fervoroso defensor do cinema de autor e Maria Schneider, que poucos anos antes tinha dado muito nas vistas em “O Último Tango em Paris” / “Ultimo Tango a Parigi”, ao lado de Marlon Brando, sob a direcção de outro italiano, Bernardo Bertolucci.


Chegamos assim a uma das questões mais prementes na obra de Michelangelo Antonioni, a questão da identidade e o subsequente desaparecimento, já presente em “A Aventura” / “L’Avventura”, a surgir aqui, não em todo o seu esplendor, porque isso será muito mais tarde em “Identificação de Uma Mulher” / “Identificazione di una donna”, mas na forma mais simples e intrigante, já que as pistas oferecidas serão sempre muito reduzidas.


David Locke (Jack Nicholson) encontra-se no Norte de África a fazer pesquisa para um documentário, recorde-se como na época o fervor terceiro-mundista estava na ordem do dia, as superpotências mantinham o confronto através dos países não-alinhados e em África o território estava em disputa constante, não por razões ideológicas (a falsa questão), mas sim pela riqueza do continente africano, como ainda hoje sucede, sem qualquer tipo de cauções. David Locke pretende entrar em contacto com um grupo guerrilheiro e na aldeia onde se encontra, pernoitando num hotel em condições muito pouco saudáveis, cruza-se com outro homem de seu nome David Robertson, assumindo-se ambos como “outsiders” numa terra estranha. Uma manhã, ao procurar o desconhecido, o jornalista encontra-o morto deitado na cama. Decide então trocar de identidade com ele e fugir dos seus problemas pessoais (a esposa) e do trabalho na televisão, cada vez mais perdido e inconsequente para ele. Porém, a curiosidade em saber mais sobre a vida do morto, leva-o a seguir o seu percurso, descobrindo que se trata de um contrabandista de armas. Vê-se assim perseguido pelos compradores, mas também pela sua própria mulher e pelo produtor do documentário que não acreditam na sua morte.


Será durante a vivência dessa nova vida, sempre em sobressalto, que David Locke (Jack Nicholson) irá encontrar uma estudante de arquitectura em Barcelona, que decide partir com ele à aventura, sem destino preciso, nascendo aqui o “road-movie” de Michelangelo Antonioni, oferecendo total liberdade às suas personagens, cuja viagem irá terminar como começou, num quarto de hotel, nascendo aqui um dos mais famosos planos sequência da História do Cinema, com David Locke deitado na cama. São sete minutos em que a câmara nos envolve lentamente no desenrolar final dos acontecimentos, demonstrando mais uma vez como o cinema é uma Arte. Poderíamos ficar aqui a mencionar outros planos-sequência célebres como é o caso do plano inicial de “A Sede do Mal” / “”Touch of Evil” de Orson Welles, um verdadeiro prodígio ou falar dos de Alfred Hitchcock ou Brian de Palma. Porém o que nos interessa aqui é na verdade deixar claro como nesta obra de Michelangelo Antonioni estão bem patentes os caminhos por onde navegava o cinema de autor nos anos setenta (do século passado) e nada melhor como tentar (re)ver este filme do cineasta italiano, com um olhar isento de memória, partindo para ele da forma mais virgem (cinematograficamente falando) e escutar a música psicadélica dos Pink Floyd.


Cineasta da incomunicabilidade Michelangelo Antonioni, apesar do problema de saúde que o incapacitou no final da vida, insistiu sempre, até nos deixar, no desejo de comunicar com o seu público e “Eros”, o seu derradeiro trabalho cinematográfico, onde assina com Steven Soderbergh e Wong Kar-Wai a realização, é a testemunha perfeita de um cineasta que encontrou no interior do corpo feminino a mais bela forma de comunicar ou não fosse essa a história da sua obra cinematográfica.

Rui Luís Lima

John Byrum - "Inserts"


John Byrum
"Inserts"
(EUA – 1975) – (117 min. / Cor)
Richard Dreyfuss, Jessica Harper, Bob Hoskins, Veronica Cartwright.

John Byrum iniciou-se no cinema como actor, no início dos anos setenta do século passado e depois passou a argumentista, director de fotografia, produtor e realizador ou seja fez a tarimba toda como se costumava dizer, à boa maneira clássica de Hollywood.


O seu filme "Inserts" foi um verdadeiro furacão no panorama cinematográfico e como alguns ainda devem estar recordados, ele foi considerado em diversos países, incluindo em Portugal, o melhor filme desse ano pela crítica cinematográfica.


"Inserts" é o termo utilizado para a designação de grandes-planos nesse género cinematográfico denominado por “hard-core” ou seja serão os "inserts" que irão definir essa categoria do desejo de que falou Roland Barthes no seu magnifico ensaio "A Câmara Clara", transformando o desejo leve (erotismos) em desejo pesado (pornografia). Em “Inserts” estamos perante um “wonder-boy” (Richard Dreyfuss, numa interpretação soberba), caído em desgraça no sistema dos Estúdios no início dos anos trinta do século XX e que se encontra refém de um produtor (Bob Hoskins) de películas pornográficas, que o pressiona a concluir o filme, rodando os inevitáveis “inserts”, que tanta falta fazem ao "desenvolvimento do movie".


John Byrum, ao centrar a acção do filme num único set e trabalhando de forma extraordinária o argumento, oferece ao espectador uma profunda reflexão sobre a ascensão e queda de um realizador no eldorado do cinema ou se preferirem nessa Hollywood toda poderosa dos célebres Tycoons.


“Inserts” é, hoje em dia, um verdadeiro “cult-movie”, que merece ser (re)descoberto por todos aqueles que gostam de cinema, apresentando-se como uma das mais apaixonantes reflexões sobre o mundo da pornografia, realizadas até hoje no interior da Industria, muitos anos antes de ter surgido o célebre "Boogie Nights"!

Rui Luís Lima

John Milius - “O Leão e o Vento” / “The Wind and the Lion”


John Milius
“O Leão e o Vento” / “The Wind and the Lion”
(EUA – 1975) – (119 min. / Cor)
Sean Connery, Candice Bergen, Brian Keith, John Huston, Steve Kanaly.

John Milius será talvez o mais esquecido cineasta da geração dos “movie-brats”, apesar do seu enorme contributo para filmes que fizeram o sucesso de uma geração, basta recordar o seu trabalho como argumentista em obras como “Apocalypse Now”, “Tubarão” e “1941 – Ano Louco em Hollywood”, entre outros, para já não falar desses argumentos espantosos que são “As Brancas Montanhas da Morte” de Sydney Pollack ou “O Juiz Roy Bean” de John Huston, para percebermos de imediato o seu valor.


Este cineasta nascido em St. Louis, Missouri, que se estreou na realização com a película “Marcello, I’m Bored”, filme de final do curso, sendo o primeiro diplomado no cinema, surpreendeu tudo e todos com a sua película “Dillinger” em 1973, (memorável a interpretação de Warren Oates, sendo de destacar na sua filmografia, obras como “Três Amigos” / “Big Wednesday” (1978 - o seu melhor filme), “Conan e os Bárbaros” / “Conan the Barbarian“ (1982) e “O Leão e o Vento” / “The Lion and The Wind”, com Sean Connery, nesta última película, a oferecer-nos uma deslumbrante interpretação na figura do árabe Mulai Ahmed er Raisuli.


Logo no início do filme iremos ser surpreendidos pela forma como John Milius filma o rapto de Eden Pedecaris (Candice Bergen) e dos seus dois filhos, por este árabe, filho do deserto, mas pertencente à família Real Marroquina, que não gosta de ver as potências ocidentais no seu país. Recorde-se que a acção da película decorre em inícios do século xx, numa época em que o Presidente Theodore Rosevelt (Brian Keith), apesar de cultivar o então célebre isolacionismo norte-americano, gostava de demonstrar que a América era uma potência militar a ser temida no contexto internacional.


Mulai Ahmed er Raisuli (Sean Connery) elege o deserto marroquino como a sua casa, mas ao raptar a americana Eden Pedecaris (Candice Bergen) vai descobrir que raptou uma verdadeira leoa, que luta com todas as suas forças, contra ele e os seus intentos, terminando por estabelecer uma relação de admiração pelo seu raptor, ao descobrir as suas verdadeiras intenções. O que não irá impedir que um contingente norte-americano desembarque no Reino de Marrocos, comandado pelo Capitão Jerome (Steve Kanaly), que de imediato toma de assalto o Palácio Real, exigindo a entrega da mulher e das duas crianças.


Iremos assistir a um curioso jogo diplomático entre as diversas potências, que tentam estender a sua influência ao Reino de Marrocos, ao mesmo tempo que vão introduzindo as suas forças militares no território, no jogo geoestratégico da época, recorde-se que estamos nas vésperas da Primeira Guerra Mundial.


O Xeque Mulai Ahmed er Raisuli (Sean Connery), tio do Príncipe, apenas pretende o reconhecimento do seu direito, a uma parcela do território, que reclama como sua, demonstrando isso mesmo aos diversos elementos que vai raptando, nunca molestando nenhum deles, acabando por criar laços de amizade com todos eles, como irá perceber a americana Éden Pedecaris (Candice Bergen), que após ser libertada e preso Mulai Ahmed er Raisuli (Sean Connery), tudo fará para alterar o seu destino.


Revisto nos dias de hoje, a película “O Leão e o Vento” / “The Wind and The Lion” de John Milius, descobrimos não só um filme com uma direcção de actores perfeita, destacando-se os protagonistas, como não podia deixar de ser, mas onde também se encontra um argumento cativante e que se tornou com o passar dos anos, motivo para uma reflexão ideológica, sobre as premissas dos conflitos culturais existentes no mundo, enquanto por outro lado estamos perante uma realização sem falhas e com uma planificação perfeita, de forma a cativar o espectador do filme.

John Milius, possivelmente o mais esquecido dos “movie-brats” merece bem, que seja descoberta a sua filmografia dos anos setenta, que possui no seu interior, uma mão cheia de belas surpresas.

Rui Luís Lima

Dick Richards - “O Último dos Duros” / “Farewell, My Lovely”


Dick Richards
“O Último dos Duros” / “Farewell, My Lovely”
(EUA – 1975) – (95 min./Cor)
Robert Mitchum, Charlotte Rampling, John Ireland.

Dick Richards é um cineasta oriundo da publicidade, onde se tornou famoso e quando decidiu enveredar pela realização, o denominado “film noir” surgiu naturalmente como tema a homenagear e assim nasceu este magnifico “Farewell, My Lovely”, baseado no célebre romance de Raymond Chandler, onde iremos encontrar o famoso detective Philip Marlowe, que se tornou bem célebre no grande écran, quando Humphery Bogart lhe deu rosto.


Desta feita, em “O Último dos Duros”, temos Robert Mitchum a “envergar o fato” do célebre detective, enquanto a bela Charlotte Rampling nos surge na eterna “femme fatale”, já a forma como Dick Richards nos conduz ao longo do filme, com uma realização certeira e uma excelente direcção de actores, permite dizer que estamos perante uma das mais belas homenagens ao policial no cinema, através de um dos romances mais célebres do género e se o filme é a cores e não no habitual preto e branco, também isso até joga a seu favor, tendo em conta o excelente trabalho do director de fotografia John Alonzo.


“O Último dos Duros” / “Farewell My Lovely” surge assim como uma bela e inesquecível homenagem ao denominado “film noir”, pela mão de Dick Richards e um soberbo Robert Mitchum!

Rui Luís Lima

Peter Greenaway - “Janelas” / “Windows”


Peter Greenaway
“Janelas” / “Windows”
(Gr-a.Bretanha – 1975) – (4 min./Cor)
Peter Greenaway

Numa pequena curta-metragem de quatro minutos, Peter Greenaway regressa a Wardour para rodar “Windows” / “Janelas”, onde se irá debruçar sobre esse tema, sempre tão presente na sua filmografia, que é a morte.


Terão sido as diversas mortes ocorridas na África do Sul, entre os presos políticos, que “caíam acidentalmente das janelas”, a fonte para o nascimento desta ficção nascida sobre as razões da morte de 37 pessoas que caíram, ao longo de um ano, na região de Wardour.


O célebre universo estatístico de Peter Greenaway surge aqui antecipando futuros trabalhos cinematográficos, onde os números estarão bem presentes, mesmo na ficção, como irá suceder com o célebre filme “Maridos à Água” / “Drowning by Numbers”!

Rui Luís Lima

Peter Greenaway - “Wrackets Aquático” / “Water Wrackets”


Peter Greenaway
“Wrackets Aquático” / “Water Wrackets”
(Grã-Bretanha – 1975) – (12 min./Cor)
Collin Cantlie

“A película “Water Wrackets” / “Wrackets Aquático” está intimamente ligada ao seu filme anterior, intitulado “Water” e que foi rodado nos cinco lagos que existem entre Salisbury e Shaftesbury, mas desta feita Peter Greenaway decidiu filmar a água que corre, pára e transborda as margens, arrastando diversos microorganismos com ela, em 155 planos fixos, onde o movimento é contínuo através do lento murmurar dessa “aqua”, que nos irá conduzir à narração de Collin Canthie, que nos envia para um texto histórico, mas de ficção, onde se nota a influência da escrita de Tolkien e da sua famosa obra “O Senhor dos Anéis”.

Rui Luís Lima

Richard Brooks - "Desafio à Coragem" / "Bite The Bullet"


Richard Brooks
"Desafio à Coragem" / "Bite The Bullet"
(EUA - 1975) - (132 min./Cor)
Gene Hackman, Candice Bergen, James Coburn,
Ben Johnson, Ian Bannen, Jan-Michael Vincent.

No ano de 1975 o cineasta Richard Brooks assinala o crepúsculo do "western", realizando o fabuloso filme "Desafio à Coragem" / "Bite The Bullet", que nos irá fazer acompanhar uma corrida de cavalos ao longo de 700 milhas (1100 Km), através de territórios bem difíceis, incluindo o temível deserto, organizada por um jornal, nesse ano distante de 1908, oferecendo um prémio bem apetitoso ao vencedor.´


Apresentam-se a competir nove cavaleiros com as suas respectivas montadas: uma mulher bela cujos motivos são (des)conhecidos (Candice Bergen); um mexicano a lutar pela sobrevivência em terras americanas (Mario Arteaga); um inglês com a sua bela montada (Ian Bannen); um jovem pistoleiro provocador, que afinal nunca tinha morto ninguém (Jan-Michael Vincent); um velho cow-boy "sem eira nem beira" (Ben Johnson) e dois veteranos da Guerra de Cuba, que até receberam um telegrama do Teddy a desejar-lhes sorte, que os comandou nessa Guerra ou seja o Presidente dos Estados Unidos da América.


Luke Matthews (James Coburn) está até bem na vida e apostou forte e feio nessa corrida, ficando meio-arruinado se a perder, já o seu amigo Sam Clayton (Gene Hackman) é um solitário depois de ter perdido a mulher em Cuba, na guerra com os espanhóis, ao mesmo tempo que vê o seu Oeste a desaparecer, ama profundamente os cavalos e fica doido com as atrocidades que por vezes se cometem com eles, quando o que eles fazem é simplesmente transportar um ser humano, até ao limite das suas forças e depois levam um tiro.


Richard Brooks antigo jornalista e um dos maiores cineastas do cinema clássico norte-americano oferece-nos um filme que se baseia num acontecimento ocorrido no início do século XX, quando o "Denver Post" patrocinou uma corrida idêntica de Evanston a Denver.


As razões que motivam a competição e as aspirações dos seus participantes são a porta de entrada para nos oferecer um retrato da condição humana, de uma crueldade idêntica à que irão sofrer os pobres animais ao longo do terrível percurso, tendo em algumas cópias da película sido cortadas alguns fotogramas das imagens mais cruéis. Felizmente a cópia a que tivemos acesso possuía a edição original e confesso que por vezes era bem doloroso de se ver.


"Desafio à Coragem" / "Bite The Bullet" de Richard Brooks é uma obra-prima do "western", nostálgico é certo, contemporâneo também, mas com todos os elementos que fizeram deste género cinematográfico, um dos mais amados pelas classes populares que enchiam as salas de cinema, quando o cinema arrastava multidões. Estou grato por ainda ter conhecido essa época!

Rui Luís Lima

Sydney Pollack - “Os Três Dias do Condor” / “Three Days of the Condor”


Sydney Pollack
“Os Três Dias do Condor” / “Three Days of the Condor”
(EUA – 1975) – (117 min./Cor)
Robert Redford, Faye Dunaway, Cliff Robertson, Max von Sydow.

Após a feitura de “Yakuza”, em terras japonesas, onde os códigos de honra e de sangue marcavam presença, Sydney Pollack realiza um dos melhores policiais de sempre com a feitura de “Os Três Dias do Condor”/”Three Days of the Condor”, oferecendo-nos uma narrativa de uma lucidez a toda a prova, transformando a película numa das obras mais comentadas do ano de 1975, ao mesmo tempo que se transformava numa das pedras basilares da sua filmografia.


Muitos anos depois, “Os Três Dias do Condor” / “Three Days of the Condor” continua a não deixar ninguém indiferente.

Rui Luís Lima

Stanley Kubrick - “Barry Lyndon”


Stanley Kubrick
“Barry Lyndon”
(EUA/Grã-Bretanha – 1975) – (185 min./Cor)
Ryan O’Neal, Marisa Berenson, Patrick Magee, Hardy Kruger.

No ano de 1975, Stanley Kubrick irá surpreender os seus admiradores ao levar ao écran um romance do século XIX, assinado por William Makepeace Thackeray. Mas rapidamente todos irão descobrir que, com “Barry Lyndon”, mergulhamos não só na história de um aventureiro, mas também nesse belo universo da pintura, onde a fotografia de John Alcott utiliza uma paleta de cores inesquecível, chegando ao ponto de usar apenas a luz das velas como iluminação para algumas sequências, que tornaram este filme memorável.


Depois temos a inesquecível banda sonora, criada por Leonard Rosenman para “Barry Lyndon”, que também foi merecedora do Oscar, assim como mais duas estatuetas que foram entregues a Oscars técnicos. Já Stanley Kubrick, apesar de ter perdido os três Oscars para que estava nomeado, terminou por vencer, ao deixar-nos este inesquecível “Barry Lyndon”, que vos convido a revisitar (na “companhia” da Marisa Berenson)!

Rui Luís Lima

Steven Spielberg - “Tubarão” / “Jaws”


Steven Spielberg
“Tubarão” / “Jaws”
(EUA – 1975) – (124 min./Cor)
Roy Scheider, Robert Shaw, Richard Dreyfuss.

No ano de 1975 Steven Spielberg, o famoso wonder-boy dos anos setenta, ao realizar “Jaws” irá obter um sucesso tão grande que irá criar o fenómeno “Blockbuster”, que a partir de então irá ser “perseguido” pelos Estúdios, sempre que chega o Verão. Iniciou-se assim uma mudança geracional dos habitantes das salas de cinema.


O livro de Peter Benchley e a realização de Steven Spielberg são memoráveis e depois temos sempre um trio de actores inesquecível constituído por Roy Scheider, Robert Shaw e Richard Dreyfuss, porque nunca é demais recordar os seus nomes e depois temos esse suspense que agarrou as plateias às cadeiras, ao longo do filme, com uma eficácia e um terror que levou muitos, ao chegarem à praia nesse ano, a olharem melhor para as águas onde iam mergulhar!

Rui Luís Lima