domingo, 5 de maio de 2024

Joel Coen e Ethan Coen - “Irmão Onde Estás?” / “O Brother Where Are Thou?”


Joel Coen e Ethan Coen
“Irmão Onde Estás?” / “O Brother Where Are Thou?”
(EUA/Grã-Bretanha/França – 2000) – (106 min. / Cor)
George Clooney, John Turturro, Tim Blake Nelson,
John Goodman, Holly Hunter, Chris Thomas King, Charles Durning.

“Irmão Onde Estás?” é a mais louca comédia dos irmãos Coen que, partindo da “Odisseia” de Homero, a transpõem para o Sul dos Estados Unidos, em plena época da depressão. Contando com uma fotografia esplendorosa de Roger Deakins, habitual colaborador da dupla, que utilizou todos os meios laboratoriais ao seu alcance para atingir a paleta perfeita, para ilustrar os locais onde a acção se desenrola, mergulhamos assim na aventura de Ulysses Everett (George Clooney, que aqui inicia uma colaboração frutuosa com os irmãos Coen), que decide evadir-se da prisão onde se encontra a cumprir pena, nesse Mississipi profundo. Mas na fuga, ele é forçado a levar consigo dois companheiros de infortúnio: Pete (John Turturro) e Delmar (Tim Blake Nelson), em virtude de se encontrarem acorrentados uns aos outros, no difícil cativeiro, facto que irá fazer fracassar a sua fuga no comboio de mercadorias, numa das sequências mais delirantes da película.


Mas o nosso Ulysses, um verdadeiro fanfarrão, vaidoso até dizer chega, consegue com os seus companheiros livrar-se das correntes que os prendem, apesar de ser perseguido por um temível xerife de óculos escuros, que irá empreender uma feroz caçada, verdadeiramente infernal, não dando tréguas aos fugitivos da penitenciária estadual.


O nosso herói, que só deseja reconciliar-se com a sua bela Penélope e recuperar o seu tesouro bem escondido dos olhares alheios, irá cruzar-se na sua via-sacra com um músico negro chamado Tommy (Chris Thomas King), que vendera, em tempos idos, a sua alma ao diabo na famosa encruzilhada, passando também ele a integrar este estranho grupo de “desperados”.


Ao longo do percurso até à terra prometida, estes homens, que só desejam respirar o doce sabor da liberdade, irão encontrar-se com o perigoso Baby Face Nelson, que lhes dá boleia, durante uma tumultuosa fuga das forças da ordem, após mais um assalto, bem sucedido. No entanto, pior que o encontro com o conhecido gangster será o falso pregador e vendedor de Bíblias Big Dan Teague (John Goodman), que se irá revelar líder dessa poderosa organização racista denominada Klu Klux Klan, construindo os irmãos Coen, neste segmento do filme, uma das mais emocionantes e criativas sequências de “Irmão Onde Estás?”.


Na verdade, o Ulysses dos Coen é bem diferente do herói de Homero, já que não passa de um homem profundamente vaidoso, sempre preocupado com o seu aspecto, enchendo o cabelo de brilhantina, chegando a usar uma rede para o cabelo enquanto dorme. Mas quem não dorme é o grupo perseguidor chefiado pelo temível xerife e quando tudo parece perdido junto da velha cabana e a forca espera pelos fugitivos, um abençoado dilúvio irá salvá-los das forças da lei, só restando a Ulysses reconquistar a sua bela Penny, sempre com o seu rancho de filhos atrás, que ao contrário da bela Penélope, não é dada a tecelagens, sendo possuidora de um feitio difícil de vergar, apesar dos argumentos infrutíferos do seu marido, o aventureiro Ulysses Everett (George Clooney).


Ao longo da película iremos conhecer também como esses longínquos anos da rádio arrastavam multidões e quando o perigoso grupo dá a escutar a sua música, à muito divulgada na rádio, num derradeiro esforço de salvar a pele num comício, consegue deixar a multidão que a este assiste em profundo delírio.


De imediato o Governador (Charles Durning), que tinha a reeleição em maus lençóis, decide aproveitar a seu favor a presença do grupo, oferecendo-lhes o tão desejado indulto, ao mesmo tempo que Ulysses Everett reconquista o coração da sua esposa.


“O Brother Where Art Thou?” oferece ao território da comédia um novo fôlego, ao qual o mais sisudo dos espectadores não consegue resistir, dadas as inúmeras referências históricas e cinematográficas introduzidas pelo argumento dos irmãos Coen, que apesar de não terem lido Homero, segundo confessaram (mas que duvidamos), nos oferecem um retrato da época da depressão, onde o humor é o motor perfeito da ficção.

Rui Luís Lima

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