terça-feira, 7 de maio de 2024

Gillian Armstrong - “Charlotte Gray”


Gillian Armstrong
“Charlotte Gray”
(Inglaterra/Austria/Alemanha – 2001) – (121 min. / Cor)
Cate Blanchett, Billy Crudup, Michael Gambon.

Gillian Armstrong é uma cineasta australiana pertencente à denominada Nova Vaga Australiana, que surgiu em finais dos anos setenta, do século XX, e onde se incluíam nomes como Peter Weir e os dois George Miller, a par de actores como Mel Gibson, Judy Davis e Sam Neil, que também acompanhavam com o seu talento a renovação do cinema australiano, que anos mais tarde Hollywood irá capitalizar.


Aliás será com o maravilhoso e denso “Mrs. Soffel”, com Diane Keaton e Mel Gibson nos protagonistas, que Gillian Armstrong irá ver abrirem-se as portas do Novo Mundo, para anos depois nos revelar essa espantosa actriz chamada Cate Blanchett, quando passou ao grande écran a famosa obra de Peter Carey “Óscar e Lucinda”, sendo o outro protagonista Ralph Fiennes. Sempre com o olhar na sua terra natal, Gillian Armstrong, irá fazer um novo “remake” do célebre “Mulherzinhas” / “Little Women”, essa obra literária que tem acompanhado diversas gerações ao longo das décadas.


Por tudo isto não é de estranhar que Gillian Armstrong e Cate Blanchett estejam lado a lado neste filme intitulado “Charlotte Gray”, o retrato de uma mulher nesses anos difíceis de quarenta, em que a Europa se encontrava em guerra. Entramos assim na vida desta inglesa numa Londres devastada pelos bombardeamentos da aviação alemã. E numa das suas viagens diárias para a capital britânica, ela irá cruzar-se com um escritor (elemento dos serviços secretos) que a irá abordar de forma discreta para ela se incorporar no esforço de guerra. Mas se foi ele que lhe ofereceu a “dica” de forma indirecta, será no entanto esse piloto de caça que ela conhece na festa de lançamento do livro do escritor, que irá mudar o seu sentido da vida para sempre. E ao saber que o seu amigo piloto foi abatido, ela não hesita em oferecer-se para os serviços secretos, para assim ser enviada para França, a fim de o tentar encontrar.


A cineasta irá oferecer-nos um retrato bastante fidedigno desse período da França, com o anti-semitismo bem latente e a forma como os franceses viam a ocupação alemã, com o Marechal Pétain e Pierre Laval em Vichi a governarem o sul da França, enquanto o Norte era administrado pelos Alemães, ao mesmo tempo que a resistência ía dando os seus primeiros passos. A pequena vila onde Charlotte irá viver surge assim como o perfeito retrato desses tempos. E a própria relação política entre as forças que combatem o invasor é-nos mostrada de forma por vezes cruel, como veremos através da história de Julien Levade (Billy Crudup em mais um bom desempenho). A par de Julien temos Levade, o seu pai, aqui interpretado por esse enorme actor chamado Michael Gambon, o qual sempre que surge no écran enche a tela com o seu talento.


“Charlotte Gray” é um filme feito por uma cineasta para a sua actriz Cate Blanchett, surgindo assim como um maravilhoso retrato feminino em tempo de guerra, mas Gillian Armstrong consegue ir mais longe, pela forma como vai delineando a evolução sentimental da protagonista, a par do nascimento de uma certa consciência política, porque tanto na vida como nas ideologias nada é linear e muitas vezes tudo se transforma numa simples palavra, num simples gesto. E aqui o mundo de Charlotte Gray irá decididamente mudar nesse dia, já depois da guerra terminada, em que confessa a Julien (1), o seu verdadeiro nome: “o meu nome é Charlotte Gray”.

(1) - Julien é também o nome da personagem principal do livro “O Vermelho e o Negro” de Sthendal, que ela lê no comboio no início do filme.

Rui Luís Lima

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