terça-feira, 7 de maio de 2024

Mohsen Makhmalbaf - “Kandahar” / “Safar e Ghandehar”


Mohsen Makhmalbaf
“Kandahar” / “Safar e Ghandehar”
(Irão/França – 2001) – (85 min. / Cor)
Niloufar Pazira, Hassan Tantal, Sadou Teymouri, Hoyatala Hakimi.

Mohsen Makhmalbaf nasceu em Teerão em 1957 e o seu primeiro filme “Tobeh Nasooh” / “O Arrependido” foi realizado em 1982. Tendo iniciado a sua actividade na rádio, o futuro cineasta rapidamente passou à escrita de romances e peças de teatro, olhando sempre o cinema de forma maravilhada. Os seus filmes, mais de uma dezena de longas-metragens, desde cedo apresentaram um olhar crítico sobre a sociedade iraniana, sentindo-se neles uma forte influência do neo-realismo italiano, aliás bem patente em todo o cinema iraniano, mas também da “nouvelle vague” francesa e desde cedo, como não podia deixar de ser, começou a ter dificuldades com a censura iraniana, que proibiu a exibição no território de quatro dos seus filmes, o que não foi impedimento para ele desistir dos seus princípios, criando uma escola de cinema, ao mesmo tempo que na sua família vai nascendo uma espécie de clã Makhmalbaf em virtude dos seus filhos, bastante influenciados pelo pai, terem decidido seguir o mesmo caminho do progenitor, sendo a sua filha Samira uma das grandes promessas do novo cinema iraniano.


Numa entrevista à revista britânica “Sight & Sound”, o cineasta referiu que quando começou a fazer cinema o seu ponto de vista era mais político. Agora entendia que a vida é maior do que a política, estando mais interessado no lado humano do que no aspecto meramente político. Quando era jovem e estava envolvido na política, era muito pessimista e queria mudar as coisas, chorar as coisas, salvar o mundo. Agora pensa que a melhor maneira de salvar a humanidade é regressar à beleza e à poesia da vida quotidiana.


Como todos sabemos a vertente situada na narração de histórias do quotidiano, acabou por surgir como a metáfora perfeita, encontrada pelos cineastas iranianos para contornarem ou enganarem, se preferirem, a feroz censura do regime que, cada vez mais, aperta as malhas em redor da sétima arte.


Quando os Taliban tomaram o poder no Afeganistão, Kandhar foi uma das suas praças-fortes, impondo de imediato o seu impiedoso regime, sendo muitos os que fugiram para os mais diversos pontos do globo. Nafas (Niloufar Pizira) foi uma das muitas jovens que, nascidas no Afeganistão, conseguiu partir do país, indo viver para o Canadá, onde se dedicou ao jornalismo, mas ao saber que a irmã, que tinha perdido as duas pernas, decidira suicidar-se, para fugir ao terror dos Taliban, regressa clandestinamente ao seu país natal para impedir o suicídio da irmã, que escolhera o dia em que iria ocorrer um eclipse, para deixar o mundo das trevas em que vivia. Iremos assim acompanhar a viagem clandestina de Nafas, possuidora de uns olhos azuis resplandecentes, que verá como a destruição, a miséria e o medo tomaram conta do Afeganistão.


“Kandhar”, que recebeu o Prémio do Júri Ecuménico do Festival de Cannes, ofereceu ao mundo um relato belo e tenebroso de uma sociedade onde a vida se desenrola no limite das suas forças, sempre com a morte a espreitar a cada minuto.


Passada mais de uma década sobre a feitura desta película, ela continua a possuir uma força que nos deixa consternados, pelo simples facto de quase tudo permanecer na mesma. Apesar da intervenção das forças ocidentais, o terror e a morte violenta continuam a existir diariamente, basta a noite começar a cair para eles saírem das suas tocas para espalharem o terror e a morte, entre todos aqueles que aspiram a respirar o simples e doce sabor da liberdade.

Rui Luís Lima

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