sexta-feira, 5 de abril de 2024

François Truffaut - "O Último Metro" / "Le Dernier Metro"


François Truffaut
"O Último Metro" / "Le Dernier Metro"
(França – 1980) – (123 min. / Cor)
Catherine Deneuve, Gerard Depardieu, Heinz Bennet, Jean Poiret, Richard Bohringer.

François Truffaut é um nome incontornável do cinema francês e “O Último Metro” / “Le Dérnier Metro” um dos seus maiores sucessos comerciais, a abrir a sua última década de trabalho no grande écran. Mais uma vez iremos ter uma das suas musas de sempre, a bela Catherine Deneuve, a surgir num dos seus melhores registos ao lado de Gerard Depardieu. E desta vez Truffaut decidiu analisar o período da ocupação e a resposta que os franceses deram à invasão.


Como todos estamos recordados, após a chegada das tropas alemãs a Paris, a França ficou de certa forma dividida até 1942, quando os alemães decidiram entrar na famosa zona de Vichi, dando por terminada uma paz dúbia e colaboracionista do Marechal Pétain, que deixou muito más recordações na memória de todos.


Em “O Último Metro” / “Le Dérnier Metro” entramos nessa Paris ocupada, através do mundo do Teatro, mais concretamente o “Teatro de Montmarte” dirigido por Lucas Steiner (Heinz Bennett), que é obrigado a refugiar-se na cave do seu Teatro e ali permanecer até à libertação, em virtude de ser judeu, passando a direcção do Teatro para as mãos da sua mulher Marion (Catherine Deneuve), ao mesmo tempo que vamos assistindo ao anti-semitismo que então vivia no coração de muitos franceses, representados aqui pela figura do crítico teatral Jean-Louis Cottins (Jean Poiret) que pretende denunciar, através das suas crónicas no jornal que dirige, todos os judeus que ainda existem na capital, num acto de colaboracionismo com as novas autoridades do Terceiro Reich.


Marion prepara a fuga do marido mas, a pouco e pouco, compreende que essa fuga está devotada ao fracasso já que muitos dos que ajudam os fugitivos, depois de receberem o dinheiro destes, os entregam aos nazis para estes serem enviados para esses campos de concentração de má memória. Por esta razão, a única solução será Lucas Steiner permanecer na cave do Teatro por tempo indeterminado, sendo ela a única a conhecer o seu paradeiro.


Nessa época, o Teatro era um dos poucos locais de refúgio dos franceses de um quotidiano que se apresentava cada vez mais negro, com as diversas investidas da Gestapo que prendiam todos os suspeitos. E será durante esse período que ela irá aceitar no elenco de uma nova peça o actor Bernard Granger (Gerard Depardieu), que possui uma admiração infinita por ela e pelo trabalho do marido.


François Truffaut irá apostar num filme em que o Teatro é o tema, assim como a relação entre os seus componentes, numa época onde o medo e o terror andavam de mãos dadas, oferecendo-nos a visão de uma França ocupada e da sua luta, vista de um grande palco.


Se Bernard Granger é um daqueles actores mulherengos, sempre a fazer a corte à primeira mulher que lhe surge pela frente, bastando ver o seu comportamento com a responsável pelo guarda-roupa do Teatro, ele é também um daqueles homens inconformados, com laços à resistência, essa mesma resistência tão débil e heróica, como um dia nos demonstrou Jean-Pierre Melville no seu magnifico filme “O Exército das Sombras” / “L’armée des ombres”, mas que não vira a cara à luta, enfrentando o adversário de cara descoberta como sucede no restaurante em que Bernard enfrenta o crítico teatral, depois deste ter escrito mais uma das suas crónicas anti-semitas, denegrindo a figura de Marion Steiner (Catherine Deneuve).


François Truffaut oferece-nos, mais uma vez, um dos seus segredos cinematográficos: a fabulosa direcção de actores, ao mesmo tempo que o “raccord” é perfeito, não havendo um plano a mais nem um plano a menos.

O amor de sempre de Marion vive refugiado na cave, mas com o passar do tempo esta descobre um outro ser para amar na figura de Bernard e os sinais começam a nascer entre a directora do Teatro e o jovem actor numa comovente história de amor.


Lucas Steiner, a pouco e pouco, começa a sentir a mudança na mulher que o protege, terminando por confessar a Bernard que sabe que ela o respeita, embora tenha conhecimento que os seus afectos se dirigem cada vez mais para o jovem actor e assim nasce um daqueles triângulos apaixonantes do qual só o espectador poderá decidir o resultado final quando, após a libertação, é revelado ao público presente na sala que Lucas Steiner sempre se manteve escondido no interior do Teatro e nesse preciso momento vemos Marion e Bernard de mãos dadas a agradecer os aplausos do público, para depois ela se colocar entre os dois homens, dando as mãos a ambos, num dos mais belos gestos de amor pelo teatro da vida.


“Le Dérnier Metro” / “O Último Metro” é uma das mais belas e comoventes obras desse cineasta que amou perdidamente o cinema e os seus actores, chamado François Truffaut.

Rui Luís Lima

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